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quarta-feira, 24 de fevereiro de 2010

A FITA BRANCA


Desde Dogville de Lars Von Trier um filme não mexia tanto comigo. A Fita Branca, amarrada no cabelo da menina ou no braço do menino, ou amarrando as mãos do rapaz para lembrá-los de que eram pecadores, malvados, perversos e de que deveriam se arrepender para receberem o perdão divino, é o título do filme de Michael Haneke. Em preto e branco, mais branco que preto, tortura o espectador como o quarto branco do Big Brother. É verdade. Tudo branco, a neve, as pessoas, a luz, mas é pra fazer jus ao nome. O filme vai passando, e eu sei que para alguns, lentamente, mas segurando o espectador atento para não perder detalhes, que eu infelizmente perdi. Foram muitos crimes e atrocidades cometidos ao longo do filme. Por que aconteceram? Se descobríssemos os culpados no final do filme, talvez descobríssemos a resposta. Assim sendo, será necessário escolher um culpado ou culpados. Se foi o médico e o monstro, digo, a parteira, então o acidente com o médico foi um disfarce ou premeditado apenas por ela. E os outros? Não vejo um motivo plausível. Então eles foram acusados por conveniência. Se foram as crianças, então quais seriam os motivos deles? Não teriam motivos para o primeiro acidente, e os que se sucederam teriam sido por inveja, raiva, extravasar no outro a agressão e raiva contida, imposta pela autoridade (Barão e pastor). O que mais me incomodou? Os castigos brutais? As demonstrações de machismo, preconceitos, abusos verbais, hipocrisia? Ver aquelas pessoas presas a personagens que eram obrigadas a representar umas as outras. Todos fingindo ser alguém que não eram ou obrigados a ser alguém que não queriam ser. Um pastor que não aceitava um não dos filhos, que eram obrigados a concordar com o que ele dizia, fosse verdade ou não. Policiais que gritavam com uma pobre menina indefeza, uma garota que ousou contar ao professor algo que não tinha coragem de contar a mãe ou ao pai, o administrador: “Pare de chorar”, praticamente dizendo que era proibido sonhar. Deixando claro que certos sonhos não se contam. Um médico que abusava da própria filha, que não tinha pra quem gritar, pedir socorro. Então como gritar, defender-se ou revidar? Em crianças menores, o deficiente ou o filho do Barão, colocando fogo no celeiro e criando acidentes. E o que dizer daqueles peões que dependiam da boa vontade paternalista do barão, do próprio médico, do pastor puritano, não foram eles mesmos crianças um dia submetidas ao mesmo tratamento e criação? E quem se atrevesse a gritar, ou cortar repolhos, sofriam represálias. Bem, muitas perguntas sem respostas. A mulher do barão o traiu? O garoto se masturbava? O professor casou-se com a sua amada? Quem foram os verdadeiros assassinos? Mas assim como aqueles crimes deixaram de ser importantes com a chegada de uma guerra de proporção mundial logo em seguida, as respostas deixam de ser importantes porque o processo é mais importante que o produto, os meios mais valiosos que os fins. Então fiquemos sem respostas, mas com muito que pensar. Talvez devêssemos todos nós, usar fitas brancas amarradas nos braços ou cabelos para lembrar-nos de algo: todos somos culpados, malvados e cruéis por natureza.

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